A Diocese de Xinxiang, na China continental, provocou uma nova crise diplomática ao "eleger" o padre Li Janlin como seu novo bispo diocesano, apesar da morte do Papa Francisco e do atual período de sede vacante na Igreja Católica. A ação, coordenada pela Associação Católica Patriótica Chinesa (CPCA), grupo controlado pelo Partido Comunista Chinês, aconteceu em 29 de abril, apenas oito dias após o falecimento do Pontífice e a uma semana do início do conclave para escolha do novo Papa.
Desafio Aberto à Autoridade Papal
O movimento representa um desafio direto à autoridade da Santa Sé, pois segundo o direito canônico, somente o Papa tem o poder de nomear bispos na Igreja universal. A decisão de avançar com a "eleição" durante o período de sede vacante - quando o trono papal está vazio - parece deliberadamente calculada para enfatizar a posição chinesa de não reconhecimento da autoridade externa sobre a Igreja no país.
Um alto clérigo chinês, que não quis se identificar por medo de represálias, explicou a situação: "A Igreja estatal não pode reconhecer o Vaticano. Para eles, é simplesmente uma potência estrangeira. Não há sequer uma menção à morte do Santo Padre no site [da CPCA]."
Dois Bispos, Uma Diocese
A situação é ainda mais complexa porque a Diocese de Xinxiang já possui um bispo legítimo reconhecido pela Santa Sé - Dom Joseph Zhang Weizhu, nomeado pelo Papa São João Paulo II em 1991. Por décadas, Zhang liderou a diocese como "bispo clandestino", não reconhecido pelo governo chinês.
Esta dualidade - um bispo oficial para o governo e outro reconhecido pelo Vaticano - tornou-se uma característica comum na vida católica chinesa desde o controverso acordo entre Vaticano e China firmado em 2018. "Não podemos saber se o novo bispo se considera o chefe da diocese ou simplesmente um auxiliar de Zhang, ocupando seu lugar", comentou outro clérigo da região.
O Controverso Acordo Vaticano-China
A "eleição" do Pe. Li destaca as profundas falhas no acordo entre o Vaticano e a China sobre a nomeação de bispos, inicialmente assinado em 2018 e renovado em 2020, 2022 e 2024. Este acordo, cuja arquitetura é atribuída ao Cardeal Pietro Parolin, Secretário de Estado do Vaticano sob o Papa Francisco, concedeu às autoridades chinesas um papel na aprovação de candidatos para cargos episcopais.
Na prática, no entanto, o acordo tem sido frequentemente ignorado pelas autoridades chinesas, que continuam instalando bispos sem consulta prévia ou aprovação da Santa Sé. Em alguns casos, o Vaticano tem reconhecido essas nomeações posteriormente, enquanto em outros, isso se torna impossível.
"A maioria de nós aqui vê o acordo como um exemplo de Pequim enganando o Vaticano e saindo impune. Esta é mais uma prova disso", afirmou um clérigo local.
Implicações para o Próximo Papa
Este desenvolvimento ocorre justamente quando o Colégio dos Cardeais se reúne em Roma para as congregações gerais que precedem o conclave papal, marcado para 7 de maio. A política da Igreja em relação à China será certamente um tema importante nas discussões entre os cardeais eleitores.
O Cardeal Parolin, considerado um dos principais papáveis e arquiteto do acordo com a China, defendeu a abordagem em janeiro deste ano, embora tenha admitido que está "progredindo lentamente — às vezes até dando um passo para trás" e que "nem sempre foi bem-sucedida" em seus objetivos principais.
Segundo Parolin, o acordo está "começando a dar alguns frutos", embora tenha reconhecido que "esses frutos podem ainda não ser visíveis".
O Futuro das Relações Vaticano-China
A decisão de Pequim de avançar com esta nomeação durante a sede vacante envia uma clara mensagem ao próximo pontífice sobre a determinação do governo chinês em manter controle sobre a Igreja Católica no país, independentemente de quem ocupe a Cadeira de Pedro.
Para os 12 milhões de católicos chineses, esta tensão contínua representa um dilema diário entre fidelidade a Roma e sobrevivência sob um regime que exige supremacia absoluta em todos os aspectos da vida, incluindo a prática religiosa.
Enquanto isso, o mundo católico aguarda para ver como o próximo Papa abordará esta questão espinhosa que coloca em risco tanto a unidade da Igreja quanto o bem-estar dos fiéis na China.