Durante as aproximadamente seis horas que Jesus permaneceu pregado na cruz, ele proferiu sete frases que foram registradas pelos evangelistas. Estas "Sete Palavras" ou "Sete Últimas Palavras" de Cristo são profundamente veneradas na tradição cristã e frequentemente meditadas durante a Sexta-feira Santa. Cada uma delas revela aspectos importantes do coração de Jesus e contém ensinamentos profundos sobre amor, perdão, confiança e entrega.
1. "Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem" (Lucas 23,34)
Em meio à dor atroz e à humilhação pública, as primeiras palavras de Jesus na cruz são de perdão. Não um perdão vago ou genérico, mas direcionado àqueles que ativamente o estavam crucificando – os soldados romanos que cravavam os pregos, as autoridades que o condenaram, a multidão que pedia sua morte.
Significado Teológico:
Esta frase manifesta a essência do amor redentor de Cristo. Ele não apenas ensinou sobre perdão, mas o praticou no momento de maior sofrimento. Isso exemplifica de maneira perfeita seu ensinamento: "Amai os vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam" (Lucas 6,27).
Reflexão Espiritual:
São João Paulo II comentou: "Do alto da cruz, Cristo não só perdoa seus algozes, mas reza por eles. Seu perdão torna-se intercessão, intercede com o Pai." Esta palavra de perdão de Jesus é um convite para examinarmos nossa própria capacidade de perdoar, especialmente quando somos feridos ou tratados injustamente.
2. "Em verdade te digo: hoje estarás comigo no Paraíso" (Lucas 23,43)
Jesus dirige estas palavras ao "bom ladrão" crucificado ao seu lado, que reconheceu sua inocência e lhe pediu: "Lembra-te de mim quando entrares no teu reino."
Significado Teológico:
Esta promessa demonstra o poder salvífico da cruz e a misericórdia imediata de Cristo. Mesmo nos momentos finais da vida, a conversão sincera é acolhida por Deus. Jesus não exige penitências elaboradas ou um longo período de provação – a sinceridade do coração e o arrependimento verdadeiro são suficientes.
Reflexão Espiritual:
São Cipriano de Cartago observou: "Que ninguém desespere de sua salvação quando vê a generosidade do perdão divino." Esta segunda palavra nos ensina sobre a esperança e a misericórdia que nunca se esgotam, não importa quão tardia seja nossa conversão ou quão grandes sejam nossos pecados.
3. "Mulher, eis aí o teu filho... Eis aí a tua mãe" (João 19,26-27)
Vendo sua mãe e, ao lado dela, o discípulo amado, Jesus estabelece uma nova relação familiar entre eles, confiando um ao cuidado do outro.
Significado Teológico:
Este momento vai além de um filho providenciando cuidados para sua mãe. Numa interpretação mais profunda, Jesus estabelece Maria como mãe espiritual de todos os discípulos, representados por João. A Igreja vê neste momento a entrega de Maria como Mãe da Igreja e de todos os cristãos.
Reflexão Espiritual:
O Papa Bento XVI refletiu: "Na cruz, Jesus não realizou um ato de solidariedade humana, mas criou algo novo: a comunidade de crentes unidos em Cristo." Esta palavra nos convida a reconhecer nossa pertença à família espiritual de Jesus e a acolher Maria como nossa mãe na fé.
4. "Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?" (Mateus 27,46; Marcos 15,34)
Por volta da nona hora (15h), Jesus clamou em voz alta em aramaico: "Eli, Eli, lamá sabactâni?" Esta é a única das sete palavras registrada por dois evangelistas, sublinhando sua importância.
Significado Teológico:
Este grito de aparente desespero é, na verdade, o início do Salmo 22, que começa com desolação mas termina em confiança e vitória. Jesus, ao citar este salmo, identifica-se com toda experiência humana de abandono e sofrimento. Teologicamente, representa o momento em que Cristo, carregando os pecados da humanidade, experimenta a separação de Deus que o pecado causa.
Reflexão Espiritual:
São João da Cruz, que escreveu sobre a "noite escura da alma", encontrou nesta palavra de Jesus a confirmação de que o próprio Cristo experimentou a desolação espiritual. Para nós, esta palavra é um conforto nos momentos em que nos sentimos abandonados por Deus, lembrando-nos que Jesus já percorreu este caminho antes de nós.
5. "Tenho sede" (João 19,28)
Após horas na cruz, perdendo sangue e fluidos corporais, Jesus expressa uma necessidade física básica.
Significado Teológico:
Enquanto em um nível literal Jesus expressava sede física, em um nível mais profundo, sua sede era pela salvação das almas e pelo cumprimento da vontade do Pai. João observa que isso aconteceu "para que se cumprisse a Escritura", possivelmente referindo-se ao Salmo 69,22: "Para matar minha sede me deram vinagre."
Reflexão Espiritual:
Santa Teresa de Calcutá encontrou nesta palavra um chamado à sua vocação de servir aos mais pobres. Ela escreveu: "Tenho sede' – são palavras de Jesus que me perseguem. Jesus tem sede de nossas almas, de nosso amor." Esta quinta palavra nos convida a reconhecer a sede de Deus por nossa amizade e a sede de tantos irmãos por justiça, dignidade e amor.
6. "Tudo está consumado" (João 19,30)
Com esta declaração, Jesus anuncia o cumprimento de sua missão.
Significado Teológico:
A palavra grega "tetelestai" usada no original tem o sentido de algo completamente realizado, pago integralmente. Não é um grito de derrota, mas uma proclamação de vitória. Jesus completou perfeitamente o plano de salvação, cumprindo todas as profecias e oferecendo o sacrifício perfeito pelos pecados da humanidade.
Reflexão Espiritual:
São Tomás de Aquino comentou: "Com estas palavras, Cristo manifestou que o mistério da redenção estava completo." Para nós, esta palavra é um convite à confiança no poder redentor da cruz e na eficácia do sacrifício de Cristo. Também nos desafia a perseverar em nossa vocação até podermos dizer, como São Paulo: "Combati o bom combate, terminei a corrida, guardei a fé" (2 Timóteo 4,7).
7. "Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito" (Lucas 23,46)
As últimas palavras de Jesus são uma oração de confiança absoluta, citando o Salmo 31,6.
Significado Teológico:
Assim como Jesus começou sua jornada na cruz dirigindo-se a Deus como "Pai", ele a termina da mesma forma. Apesar do sofrimento e da aparente derrota, sua confiança no amor do Pai permanece inabalável. Esta entrega voluntária de sua vida demonstra que, como ele mesmo havia dito: "Ninguém a tira de mim, mas eu a dou por minha livre vontade" (João 10,18).
Reflexão Espiritual:
São Francisco de Sales escreveu: "A perfeição do amor consiste na perfeita conformidade com a vontade divina." Esta última palavra de Jesus nos ensina a confiança filial em Deus e a entrega de nossa vida em suas mãos, especialmente nos momentos de sofrimento e na hora de nossa morte.
Uma Espiritualidade das Sete Palavras
Juntas, as sete últimas palavras de Jesus formam um tesouro espiritual que tem inspirado santos e místicos ao longo dos séculos. Elas nos oferecem uma síntese do Evangelho:
- Perdão para os inimigos
- Misericórdia para os pecadores arrependidos
- Criação de uma nova família espiritual
- Solidariedade em nosso sofrimento
- Sede de almas e da vontade de Deus
- Certeza da redenção completa
- Confiança filial em Deus Pai
Na tradição católica, muitas devoções foram desenvolvidas em torno destas sete palavras, incluindo a prática de meditar sobre cada uma durante as sete sextas-feiras da Quaresma ou durante as Sete Horas Santas na Sexta-feira Santa.
Conclusão: Um Testamento de Amor
As sete últimas palavras de Jesus na cruz constituem seu testamento espiritual para nós. Mesmo no auge do sofrimento, suas palavras revelam um coração pleno de amor, perdão, preocupação pelos outros e confiança no Pai. Como escreveu São João Paulo II: "Do alto da cruz, Cristo nos ensina que a verdadeira medida do amor é amar sem medida."
Ao meditar nestas palavras durante a Sexta-feira Santa, somos convidados não apenas a contemplá-las, mas a permitir que elas moldem nossa própria vida, nossas atitudes e nossas palavras. Por que, como disse São Paulo: "O amor de Cristo nos impele" (2 Coríntios 5,14).